Desde 2020, os serviços de proteção ao consumidor registraram um aumento expressivo nas queixas sobre débitos automáticos não autorizados em contas bancárias. Segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), a disparada nas reclamações está relacionada à Resolução nº 4.790 do Banco Central (BC), que permitiu que instituições financeiras solicitassem a inclusão de débitos em contas de clientes de outros bancos.
A norma, que entrou em vigor em 2020, transferiu a responsabilidade pela autorização do débito para o banco “destinatário”, ou seja, aquele que recebe o valor, enquanto o banco no qual a conta está registrada passa a ser apenas executor da cobrança. Antes da mudança, somente o próprio banco do cliente poderia incluir cobranças, mediante autorização direta.
De acordo com a plataforma Consumidor.gov.br, o número de reclamações sobre cobranças não reconhecidas saltou de quase 12 mil, em 2019, para cerca de 56 mil em 2021 — um crescimento de 376%. Em 2024, mesmo com uma leve redução, o número ainda se manteve cerca de 180% acima do registrado antes da resolução. Já o ProConsumidor, usado pelos Procons estaduais, passou de 82 registros em 2020 para mais de 110 mil em 2024.
A Febraban reconhece que a mudança gerou uma “externalidade”, ou seja, efeitos colaterais que recaem sobre os bancos que executam os débitos, mesmo que não sejam responsáveis pela cobrança original. Isso tem resultado em desgastes junto aos clientes e aumento de ações judiciais.
Entre os consumidores mais afetados estão beneficiários do INSS, que relatam ter descoberto descontos meses após o início das cobranças. Muitos afirmam não terem recebido qualquer aviso prévio — prática que os bancos alegam ter implementado por meio de notificações nos aplicativos.
Um dos casos foi o do aposentado Armando Quintanilha Boechat, que perdeu mais de R$ 1 mil entre julho de 2023 e 2024 sem saber da origem dos descontos. As empresas envolvidas, como Paulista Serviços e Aspecir, são autorizadas pelo BC e estão entre as 200 empresas com mais processos judiciais em andamento no país, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Embora as empresas afirmem que os descontos são autorizados por contratos assinados ou gravações telefônicas, muitos consumidores negam ter conhecimento dessas autorizações.
O Banco Central informou que os bancos devem verificar a identidade e o perfil tanto do cliente quanto da instituição que recebe o valor, como forma de evitar irregularidades. A discussão sobre a eficácia da norma e os direitos dos consumidores segue em debate.

Banco Central do Brasil (BC). — Foto: Adriano Machado/ Reuters